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sábado, 26 de julho de 2014


O mundo impotente

 Um morticínio de palestinos na Faixa de Gaza. Outro dos infelizes passageiros do avião MH-117, para profunda tristeza de seus familiares e dos homens que agregam valor à vida humana. Como bem enfocou o editorial de O Valor de 22/7/14, a ONU é um organismo incapaz de enfrentar essas barbáries. Emite declarações condenatórias e tudo fica como dantes.

Passou a hora de repensar-se as relações internacionais. O direito internacional sempre padeceu de crise de autoridade. Não é equipado de sanções eficazes. Se um indivíduo rompe o direito alheio, um Estado nacional organizado o pune, na órbita civil ou criminal, ou em ambas. A pena espanta, exemplifica, muito embora, em vários países, não exerça sua importante função pedagógica, querida pelos acadêmicos. Já no plano internacional, um Estado vítima, por invasão de parte de seu território ou um atentado infame como o assassinato dos passageiros do Boeing, só tem um meio de fazer valer sua soberania: decretar a guerra justa, o "ius bellum", o que importa em consequências ainda mais graves no mundo atual.

Isso porque  a ONU permanece em insuperável platitude, principalmente quando Estados agressores predominam em seu anacrônico Conselho de Segurança. Por incrível que possa parecer, cinco Estados valem mais que a Assembléia Geral. Não há concepção democrática que compreenda esse fenômeno, que só teve sentido num momento histórico atípico do século passado.

A imposição de sanções econômicas aos Estados transgressores ou foras da lei refoge à lógica mais elementar, porque os cumpridores das penas são os povos. Os governantes, funcionários militares e as elites do poder, causadores de inomináveis agressões,  sempre têm meios de safar-se.

Tais conjeturas nos levam, mais que a uma "modernização" da ONU, a uma revisão completa de todas as instituições internacionais. Num mundo que se globalizou, há de ser concluído, por um pacto entre as nações, um Estado Mundial, dotado de força coercitiva para apenar não os povos, mas os agentes responsáveis pelas atrocidades que hoje nos abalam. Somente penas individualizadas, físicas, que não passem da pessoa do delinquente,  mas que envolvam todos aqueles que contribuíram para o crime, como assentado no direito penal comum, podem amedrontar e evitar novas catástrofes. Grupos em conflito ou terroristas têm de temer as penas mais severas possíveis. A começar dos governantes que os estimulam. Os que organizaram e provocaram atos bélicos e ofensivos aos direitos do homem são os criminosos, não a população civil.  O Tribunal de Nuremberg, o episódio Pinochet e alguns outros descortinaram o caminho, porém os procedimentos foram insignificantes ante os tremores que abalam o mundo, por razões econômicas, geopolíticas, religiosas etc.

O jurista John Rawls, que transformou o modo jurídico de encarar os fatos que devem estar submetidos a normas coerctivas, concebeu o "direito dos povos" no lugar do direito internacional e dos Estados soberanos. Nada mais oportuno, porquanto se considera que todos os povos tendem a bem relacionar-se, como corolário da própria natureza humana. No entanto, por viverem em condições de vida adversas, uns sob Estados bem ordenados, outros sob Estados onerados, principalmente no campo social, essa convivência fica, não raro, comprometida,  Assim, a erradicação das injustiças e a introdução da isonomia real e das liberdades públicas no interior de cada Estado será grande instrumento propulsor à criação do Direito dos Povos.

No plano coercitivo, são necessários, além de um organismo internacional totalmente renovado, Tribunais Internacionais ágeis e eficientes, que não podem ficar ao sabor das forças políticas das nações. Sua independência é imperativa, sem a qual esses sicários, que provocam mortes em série, a exemplo  dos fatos de Gaza e da derrubada de uma aeronave comercial com 298 passageiros, continuarão a agir e gerar as tragédias contemporâneas.

 

Amadeu Garrido de Paula - advogado especialista em Direito Constitucional, Civil, Tributário e Coletivo do Trabalho.

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